O ensino de Medicina, que movimenta um mercado bilionário, é uma das grandes discussões na educação superior nos últimos anos
Desde 2013, universidades com conceitos mínimos em avaliações do Ministério da Educação (MEC) colocaram no mercado quase 50 mil médicos formados, o que representa 21,4% do total.
O governo federal anunciou medidas recentes para avaliar melhor os cursos e os alunos de Medicina, mas o País tem um contingente de doutores e doutoras já trabalhando não se sabe como nem onde.
Em uma década, 229.667 médicos se formaram em todos os cursos de Medicina do País e 49.336 estavam em universidades que tiraram notas 1 e 2 no Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade), do MEC.
Os dados foram tabulados para o Estadão pelo pesquisador e consultor em avaliação Alexandre Nicolini, a partir do Censo da Educação Superior e do Enade, entre 2013 e 2023 – os mais recentes. Como a avaliação só é realizada a cada três anos, foi feita uma estimativa replicando o porcentual de egressos dessas instituições nos períodos sem prova

O ensino de Medicina, que movimenta um mercado bilionário, é uma das grandes discussões na educação superior nos últimos anos. Com mensalidades médias de R$ 9 mil e evasão baixíssima, estima-se que cada vaga representa um ativo de R$ 2 milhões para a instituição.
A quantidade de estudantes duplicou nos últimos dez anos, passando das 40 mil atualmente. Nesse crescimento desenfreado há um caldo que envolve o programa Mais Médicos, diversas aquisições de pequenas instituições por grandes grupos e uma moratória.
A tentativa do governo de paralisar o boom de novos cursos em 2018, que vinha desde os Mais Médicos em 2013, causou uma enxurrada de liminares na Justiça questionando o impedimento e uma consequente autorização de mais milhares de vagas por juízes pelo País todo. Até que o Supremo decidiu em 2024 que o crescimento só poderia se dar respeitando as regras dos Mais Médicos, ou seja, onde há déficit de profissionais.
Isso organizou um processo regulatório caótico, mas não garantiu qualidade nem atendimento para quem mais precisa. Mesmo com novas regras e incentivos, ainda é difícil manter o médico nas pequenas cidades em que ele se forma – principalmente porque as residências estão nos grandes centros.
E os resultados do último Enade, divulgados em abril, mostram que os novos cursos têm avaliação pior que os mais antigos, em especial em universidades privadas. Conta-se nos dedos o número de instituições particulares com nota máxima em Medicina; na capital só a Santa Casa e Faculdade Albert Einstein, ambas sem fins lucrativos.
O MEC anunciou recentemente uma nova prova anual para formandos em Medicina, mas cujo desempenho não está atrelado ao diploma. O que pode ajudar a selecionar melhores profissionais é que ela também servirá como via de acesso a residências médicas. Mas os médicos podem atuar como generalistas, sem essa especialização.
Já o Conselho Federal de Medicina (CFM) defende algo mais radical: um projeto de lei, em discussão no Congresso, que cria uma espécie de OAB dos Médicos. Só a aprovação no exame permitiria o exercício da profissão.
Há quem discorde da prova alegando que ela tiraria a autonomia das instituições de ensino, criaria reserva de mercado, e faria currículos se voltarem para a certificação. É preciso discutir o melhor modelo – ou se os dois devem coexistir.
Mas a estimativa de 50 mil formandos em cursos de baixa qualidade mostra que o País precisa olhar tanto para a formação quanto para o exercício profissional dos médicos de hoje para garantir a saúde do futuro do Brasil.
Comentário nosso – A prova anual proposta pelo MEC talvez não seja suficiente já que parte dos novos médicos pode atuar como generalista. E coitado de quem for se consultar com este tal de generalista, profissional que deveria saber de tudo e não vai saber de nada. O ideal, a nosso ver, é o que propõe o Conselho Regional de Medicina. Uma espécie de Exame da Ordem, como os advogados têm o Exame da OAB. Se não for aprovado, não pode exercer a profissão. Pode até ser conselheiro do Tribunal de Contas da Paraíba, onde não precisa saber de nada, mas não pode exercer a profissão de médico. (LGLM)