O SUS agoniza… (seguido de comentário nosso)

By | 09/07/2023 8:40 pm

Três em cada quatro brasileiros dependem única e exclusivamente da Saúde Pública, caso necessitem de cuidados em saúde, sejam estes, preventivos, diagnósticos, terapêuticos ou de reabilitação. E há a garantia de um forte arcabouço constitucional para prover atenção integral a todas essas necessidades em saúde do povo brasileiro. Está na Carta Magna de 1988, a denominada Constituição Cidadã, no seu artigo 196, quando se lê: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. Já o Sistema Único de Saúde – o SUS, o único porto seguro de mais de 150 milhões de brasileiros, encontra sua fundamentação legal a partir de três importantes documentos: a própria Constituição Federal de 1988, na qual a saúde, a previdência e a assistência social estruturam a seguridade social; a lei 8.080 de 1990, a denominada Lei Orgânica da Saúde, que dispõe sobre a organização, a regulação das ações e dos serviços de saúde no país e a Lei 8.142, de 1990, que define a participação popular no SUS e dispõe sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na esfera da saúde. Dentre os princípios doutrinários do SUS assinalam-se as suas diretrizes de universalidade, integralidade e equidade.No entanto, em que pese todo esse aparato legal da saúde no Brasil, o SUS agoniza…! O SUS pede socorro…! Observa-se, lamentavelmente, um subfinanciamento (definido a partir do percentual do gasto público em saúde relacionado ao produto interno bruto (PIB) e do gasto per capita – ambos comparados a países com sistema universal de saúde) e um desfinanciamento progressivos da saúde em nosso país, agravados, a partir de 2016, pelo conjunto de regras fiscais e do teto de gastos definidos pela Emenda Constitucional n.º 95, quando congelou por 20 anos os gastos sociais no Brasil. Só com a EC 95 a saúde pública no Brasil já perdeu cerca de R$ 37 bilhões até o ano de 2022. Em outra vertente, com a EC 109/2021, na qual se observa a desvinculação de recursos da saúde para pagamento da dívida pública, as perdas do SUS foram acrescidas em mais R$ 11 bilhões, fechando, portanto, em torno de R$ 48 bilhões a menos o financiamento da saúde pública no Brasil. Segundo a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip), a seguridade social, entre os anos de 1995 e 2015, perdeu cerca de R$ 768 bilhões por conta da Desvinculação das Receitas da União (DRU), uma das principais fontes geradoras do superavit primário (principal objetivo: pagamento do serviço da dívida). Some-se a todo esse cenário caótico acima, as mudanças no perfil de morbimortalidade das enfermidades do povo brasileiro, com um aumento das Doenças Crônicas Não-Transmissíveis (DCNT) e, em outra vertente, o envelhecimento progressivo da população, patente no último censo demográfico brasileiro de 2023, agravados, mais ainda, pelos efeitos a longo prazo decorrentes da pandemia pelo SARS-CoV-2, a COVID-19.Os gastos com saúde, em todo mundo, dependem de vários fatores, mas estima-se que seja em torno de 10 trilhões de dólares atualmente, cerca de 8,2% do PIB mundial, projetando-se um crescimento da ordem de 2,5 vezes por volta do ano de 2040. No Brasil, o gasto total com saúde em relação ao PIB, entre os anos de 1990 e 2018, saiu de 6.7% para 9,5% do PIB. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), esse percentual é semelhante àquele de países com acesso universal à saúde, como Canadá (10,8%), Reino Unido (10,2%), Portugal (9,5%) e Espanha (9,1%), e acima da média da Europa (8,6%). Entretanto, nestes, o gasto público com saúde equivale a cerca de 70% a 80% do gasto total, ao passo que, no Brasil, corresponde a cerca de 3,9%, ou seja, menos da metade do gasto global, portanto. As despesas totais com saúde em nosso país são, em sua maioria, com recursos de origem privada (5,8% do PIB: despesas de famílias e instituições sem fins de lucro a serviços das famílias) realmente um contrassenso para um país com sistema universal em saúde. Estamos gastando cada vez menos, e gastando mal. Há desperdícios. Há corrupção. Há desvios. Há desfinanciamento! Há subfinanciamento! E a população sofre!

Durante a pandemia, no combate à COVID, o SUS demonstrou, mais uma vez e inequivocamente, toda a sua pujança e importância estratégica para saúde pública em nosso país. Urge, portanto, um sólido Pacto Federativo pela Saúde no Brasil! Que seja construído um amplo e profundo debate nacional, sobre o fortalecimento e a sustentabilidade do SUS, que passa, obrigatoriamente, por revisão do seu financiamento, da sua governança e do seu processo de gestão, com a participação democrática da sociedade, das entidades de classe de todo ecossistema da saúde, do congresso nacional e do governo federal, na construção de soluções para os seus enormes desafios, buscando sempre atender aos seus princípios basilares, doutrinários, de universalidade, integralidade e equidade.

Gláucio Nóbrega de Souza é paraibano, médico formado há mais de 30 anos pela UFPE, CRM 4299-PB, mestre em Medicina, Conselheiro do Conselho Regional de Medicina do Estado da Paraíba, especialista em Gastroenterologia, Clínica Médica e Endoscopia Digestiva, além de possuir especialização em inteligência artificial. É também especializando em Gestão e Economia em Saúde pela Faculdade de Saúde Pública da USP.

Comentário nosso

A denúncia é seriíssima. O SUS é uma das experiências mais exitosas do mundo em termos de assistência pública de Saúde.  Ele praticamente tornou universal a assistência médica aos mais de duzentos milhões de brasileiros menos favorecidos economicamente. Sem o SUS muitos milhões de brasileiros já teriam morrido à mingua de assistência médica. E o SUS agoniza por irresponsabilidade e má vontade dos nossos governantes, a serviço dos interesses do comércio da saúde, que reduzem irresponsavelmente os recursos destinados ao SUS.  E o denunciante é um profissional dos mais competentes e mais sérios, filhos de um dos melhores profissionais de medicina que Patos já teve, o saudoso Dr. Olavo Nóbrega, Um dos médicos de que tirou a medicina de Patos do quase charlatanismo para uma medicina moderna, setenta anos atrás. O brado do Dr. Gláucio deve ser amplificado por todos que se preocupam pela saúde do povo brasileiro. Salvemos o SUS, ou milhões de nós, que não podemos pagar por um plano de saúde, morreremos à mingua.  A medicina preventiva dos Programas de Saúde da Família, agem preventivamente, mas os que escapam da prevenção dependem do SUS, principalmente para os tratamentos mais prolongados e para as cirurgias e sem o SUS estaremos muitos mortos à mingua. Parabéns a Marcelo por abrir espaço para esta denúncia do gastroenterologista patoense Dr. Gláucio Nóbrega de Sousa. (LGLM)

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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