CNJ veta novos benefícios sem decisão transitada em julgado; regra precisa ser início da moralização dos supersalários
Num gesto de razoabilidade, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) baixou uma resolução que impede órgãos do Poder Judiciário de reconhecer e pagar novos benefícios ou vantagens a seus membros por medida administrativa.
A partir de agora, esses desembolsos só poderão ser definidos a partir de decisões judiciais transitadas em julgado. O pagamento de retroativos, assim, dependerá de autorização da Corregedoria Nacional de Justiça.
A deliberação do CNJ, presidido pelo ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), é tardia e parcial (não afeta “penduricalhos” consagrados), mas espera-se que seja o marco de uma mudança de atitude.
A tônica nos últimos anos vinha sendo a de facilitar a cornucópia de vantagens que as carreiras jurídicas do Estado brasileiro criam para si mesmas, num movimento duplamente perverso, já que contribui para erodir tanto as finanças públicas como a própria credibilidade da Justiça.
Entre 2020 e 2024, juízes federais receberam em média R$ 145 mil mensais, entre salários, licenças, gratificações, auxílios e pagamentos retroativos. O teto salarial estabelecido pela Constituição é de R$ 46,4 mil.
E a sangria de recursos não fica restrita aos juízes federais. O chamado efeito cascata faz com que as vantagens “descobertas” pelos grupos mais criativos rapidamente se espalhem tanto para as Justiças estaduais como para outras carreiras, como ministérios públicos e defensorias.
Como muitos desses penduricalhos são pagos a título de indenização, servidores que recebem essas verbas ficam livres até do recolhimento do Imposto de Renda, o que cria camada adicional de desigualdade republicana.
Num país mais afeito ao império da lei, o teto seria teto, e o recebimento de indenizações seria expediente excepcional para de fato indenizar o servidor por despesas em que tenha eventualmente incorrido por necessidades do cargo —jamais algo quase regular que pode multiplicar em várias vezes o que deveria ser o vencimento máximo.
Uma das consequências desse tipo de esperteza é a perda de confiança no Judiciário. Se os membros das carreiras jurídicas não hesitam em torcer a letra da lei para extrair benefícios para si mesmos, como confiar na justeza das sentenças e acórdãos?
Somem-se a isso participação em eventos luxuosos no exterior patrocinados por lobistas, abuso de decisões monocráticas, pouco caso para com as decisões anteriores (estabilidade jurídica) e o não reconhecimento de conflitos de interesse mais ou menos óbvios —e temos uma receita infalível para crises de credibilidade.
O Judiciário, apesar de ser um Poder não eleito, não é invulnerável à opinião pública. Resta torcer para que a cúpula da Justiça perceba a armadilha que está criando para si mesma e faça as correções necessárias. Moralizar a questão dos penduricalhos seria um primeiro passo.
Comentário nosso – Não basta proibir daqui para a frente. Tem anular tudo o que feito nos últimos cinco anos e obrigar a devolver o que receberam indevidamente. (LGLM)