Aposentados e pensionistas carregam fardo de ter de comprovar pilhagem de seus benefícios em fraude que escancara descontrole de sucessivos governos e só reforça a necessidade de uma CPMI

Uma auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU), que deu azo à deflagração da operação, em parceria com a Polícia Federal (PF), sugere que a ladroagem deve ter feito milhões de vítimas – afinal o INSS emitiu 9,4 milhões de notificações. E são elas, as vítimas, que agora têm de enfrentar um calvário em busca de ressarcimento por um prejuízo que muitas nem sequer haviam identificado. De fato, o relatório divulgado pela CGU no dia em que a ação policial foi deflagrada, no final de abril, apontava que a maioria dos beneficiários desconhecia os descontos ou achava que eles eram obrigatórios.
A CGU puxou o fio de fraudes que ocorriam a conta-gotas, com débitos de pequenos valores em um volume extraordinário de benefícios, numa ramificação tão abrangente que torna indecoroso o descontrole do governo sobre a manipulação dos benefícios do INSS – e não apenas deste governo, a bem da verdade. Como apontam as investigações, os descontos foram iniciados em 2016, durante o governo Michel Temer, e ganharam escala em 2022, na gestão Jair Bolsonaro, quando houve dispensa da necessidade de revalidação anual.
No primeiro dia de recebimento de contestações, 41 entidades associativas foram citadas por aposentados e pensionistas como responsáveis por descontos indevidos, bem mais que o total de 12 que vinham sendo investigadas pela PF e que tiveram pouco mais de R$ 2 bilhões bloqueados para ressarcir as vítimas. É pouco e, como já admitiu a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, recursos do erário poderão vir a ser utilizados para reembolsar aposentados e pensionistas roubados sob as barbas do poder público.
Ao menos até agora, o governo Lula da Silva não deu mostras de que conseguirá arquitetar uma solução que atenda a todos os lesados no menor tempo possível, como seria razoável para uma situação indefensável como esta. Para boa parte das vítimas, fazer uma reclamação por meio de um aplicativo digital é algo pouco amigável e até mesmo inacessível.
Ademais, a julgar pelo comportamento do governo desde quando estourou o escândalo, preocupa a morosidade e os caminhos tortuosos que podem ser adotados para corrigir o descalabro. Entre a deflagração da operação e a demissão de Carlos Lupi do Ministério da Previdência, passaram-se nove longos dias, apesar das evidências de que, no mínimo, houve negligência por parte do agora ex-ministro.
Ao nomear como substituto Wolney Queiroz, braço direito de Lupi, Lula trocou seis por meia dúzia. O novo ministro, por óbvio, culpa o governo Bolsonaro pela proliferação de associações fraudulentas. Providencialmente, Queiroz parece ter esquecido que ele próprio, como deputado, em 2021, foi coautor da emenda que adiou a exigência de revalidação anual dos descontos em folha.
Tudo isso só fortalece a necessidade de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para apurar um esquema que parece ter contado ora com a omissão, ora com a colaboração de muitas autoridades no Executivo e no Congresso nos últimos anos.
O governo tenta evitar que a CPMI seja instalada, mas, se isso não for possível, buscará colocar aliados em cargos importantes do colegiado, como a presidência e a relatoria, para delimitar as investigações, responsabilizar a gestão Bolsonaro pela origem do problema e, de quebra, vender a falácia de que foi Lula quem acabou com o esquema.
Tão importante quanto descobrir como isso começou é apurar como tudo continuou por tanto tempo. Mas o fundamental é estabelecer controles rígidos no INSS para impedir que escândalos como este jamais voltem a se repetir. Do contrário, será mais uma CPMI que acabará em pizza.